Por Walter McAlister
O pintor belga surrealista René Magritte
pintou um quadro de um cachimbo simplesmente. Embaixo do objeto e, em
francês, escreveu: Isto não é um cachimbo. Ele é um dos meus artistas
plásticos prediletos. Sua técnica não foi nada excepcional. Entre
artistas ele não é considerado um talento extraordinário, mas foi um
pensador extraordinário. Suas imagens enigmáticas incluem o famoso
retrato de um homem vestido de terno e chapéu inglês com uma maçã verde
flutuando à frente de seu rosto. São quadros que nos levam a pensar.
Bom, pelo menos levavam. Hoje em dia, o
surrealismo de Magritte, Salvador Dalí, De Chirico, Miró e outros tantos
serve mais como ilustração de propagandas e decoração de salões do que
propriamente uma provocação à reflexão sobre o mundo e sobre a
filosofia. Não sabemos mais fazer uma leitura de comunicação sutil e
artística. Somos brutalizados e mais vale uma torta na cara do que um
quadro que exige mais do nosso tempo e o exercício dos nossos neurônios
flácidos e atrofiados.
A mente é um músculo preguiçoso. Se não
houver esforço nosso, sempre seremos atraídos pelos meios que menos
exigem o seu exercício. Por isso mesmo, temos dificuldade em compreender
as coisas. Dependemos de flashes, sound bites, factoides e opiniões que
não exigem qualquer tipo de reflexão. Como passarinhos, queremos que
alguém mastigue a nossa comida mental e depois, com bicos escancarados,
piando desesperados, esperamos que alguém “relevante” nos enfie goela
abaixo o suficiente para nos alimentar – para que não caiamos no limbo
mental que, de fato, já é onde moramos faz tempo.
Se alguém olhasse o quadro de Magritte,
sem entender o francês, concluiria que estaria perante um cachimbo. Mas o
artista queria nos fazer pensar. Claro que não é um cachimbo. É uma
representação artística de um cachimbo – uma pintura de um cachimbo, mas
não um cachimbo.
A ambiguidade da comunicação é algo que
poucos entendem. Linguagem é um instrumento de comunicação tremendamente
limitado. Tragicamente, não entendemos os seus limites e, assim sendo,
nadamos num caldo de equívocos diários. Termos como “evangélico”,
“católico”, “cristianismo” e tantos outros são empregados sem a menor
noção da sua incrível complexidade e da sua frustrante ambiguidade.
Tratamos estes termos como denominações que podem ser identificadas com
uma exatidão quase científica. De longe, todo católico é papista,
marista, tomista, idólatra, preconceituoso e, por que não dizer,
petista? De longe, todo evangélico é biblicista, conservador,
retrógrado, preconceituoso e, já foi dito, “otário” também.
Paradoxalmente as duas vertentes caem
debaixo de um termo, por demais ambíguo e equivocado que é
“Cristianismo”. Esqueça por um instante o que dizemos, uns sobre os
outros e fiquemos apenas com o que dizem a nosso respeito. Os que não
são da fé nos veem como farinha do mesmo saco. Somos antidemocráticos,
homofóbicos, preconceituosos, fanáticos, medievais, fruto de lavagem
cerebral e desmiolados por crermos na existência de um Deus – somos
simplórios e supersticiosos.
Protestamos! Somos “crentes”. Só que
demônios também são crentes. O QUÊ?! Sim, foi o que Tiago disse: “Você
crê que existe um só Deus? Muito bem! Até mesmo os demônios creem — e
tremem! (Tiago 2.19). A crença que leva a tremer é demoníaca. Somos
crentes? Sim, mas a forma como reagimos ajuda a definir melhor esta
palavra – ambígua, por sinal. Está vendo que bradar um título não é o
suficiente para se fazer entender? Isso é coisa de propagandista e não
de quem quer se comunicar.
Ambiguidade não mora no meio de
comunicação, mas é fruto do barulho que ressoa dentro de nós. O barulho
mental é fruto de boatos, desinformação, mensagens ouvidas, pedaços de
programas de TV ou rádio, conversas de botequim e por aí vai. Por não
organizarmos os nossos pensamentos e discipliná-los por leitura, estudo e
reflexão, linguagem acaba servindo mais para confundir do que para
elucidar. As dúvidas e os equívocos se multiplicam e francamente, não
sei como não enlouquecemos. Talvez por isso mesmo é que Friedrich
Nietzsche disse: “Loucura em indivíduos é raro, mas em agremiações,
sociedades e governos é a regra”.
O manicômio mental rende dividendos para
os que sabem usar os equívocos em benefício próprio. São comunicadores
que sabem que os pintinhos precisam da bocada, goela abaixo. Mastigam as
suas falácias e a sua propaganda e, misturado ao gosto da sua própria
saliva (e por que não dizer “lábia”), “alimentam” os pintinhos aos
milhares, que nunca aprenderam a voar e nem sequer a mastigar o bom
alimento por sua própria conta. E os pintinhos aplaudem, elogiando o
brilhantismo desses “homens de Deus”. Trágico e calamitoso espetáculo do
absurdo coletivo.
Mas, onde está a chave do manicômio?
Como sair? Como aprender a voar? Desligue a TV. Leia. Leia o que puder.
Faça um seminário. Frequente uma igreja que ensina a Bíblia. Carregue um
bom livro contigo sempre. Senão, vai acabar folheando a revista “Caras”
enquanto espera por sua vez no dentista. Hora perdidas. Mentes
perdidas. O manicômio está lotado. Estamos nos acotovelando de tão
abarrotado que está. Praguejamos, com as mesmas palavras que ninguém
compreende.
É uma realidade irônica. Numa sociedade
que tem a seu alcance tantos meios de comunicação: televisão,
literatura, rádio, revistas, teatro, cinema, Internet etc, nunca nos
vimos tão isolados, tão carentes de clareza… e tão perdidos.
Para quem quer se fazer entendido, é uma
verdadeira idade medieval. Mas não vou desistir e sei que há outros que
estão tentando ponderar, mesmo que a sua voz pareça um sussurro perante
o furor de ondas ensurdecedoras. Quem ouvir faz bem.
***
Walter McAlister é pastor, escritor da contundente obra “O fim de uma Era”. Texto oriundo do seu
blog pessoal.