Ultimamente
tenho falado demais, tenho inundado as pessoas ao meu redor com comentários em
grande parte vazios de conteúdo, simplesmente com intuito de falar, dar minha opinião,
comentar sobre o assunto. Hoje temos vivido em uma época que todos sabem de tudo
e poucos sabem alguma coisa. Existem doutores sem diplomas, psicólogos de
esquina, professores analfabetos e muitos que sabem de política, religião e
ciência melhor do que ninguém. Estamos cada dia falando mais e ouvindo menos,
não paramos para escutar o outro, quando estamos em uma conversa e ficamos por
algum tempo sem dar a nossa opinião já é motivo para ficarmos irritados e
dispersos ao diálogo, queremos mostrar que somos entendidos, queremos falar, opinar,
discutir e não conseguimos o simples, ouvir.
Lembrei-me de um texto de Rubem Alves sobre
saber ouvir, li este texto pela primeira vez há muito tempo, acho que devia ter
uns 13 anos, por aí, tinha mania de percorrer o centro de Belo Horizonte atrás
de sebos, novo ainda eu já me aventurava por galerias e edifícios velhos, ia várias
vezes ao edifício Maleta na Rua da Bahia, lá era um dos meus lugares favoritos,
coincidência ou não semana passada estive lá, fui a uma encadernadora que meu
Pastor indicou para colocar uma capa de couro na minha Bíblia, ela já está
velha, tanto a bíblia quanto a encadernadora, a bíblia está soltando algumas
folhas, mas foi presente da minha mãe, ela tem marcações antigas, detalhes que
facilitam a busca de algum texto, por isso é difícil aposentá-la e partir para
uma mais nova, para mim bíblia quanto mais velha melhor. Ah... Como ia dizendo
entrei no Maleta esta semana e me veio a memória belos dias que passei ali,
vasculhando sebos, como tenho saudades daqueles tempos, alguns de vocês podem até não saber o que é
um sebo, creio que aqueles que nasceram da década de 90 para cá talvez nunca
entraram em um, os mais velhos e amantes da leitura sabem que sebo é uma
livraria onde se comercializa livros usados, verdadeiros alfarrábios. Sentia um
enorme prazer em encontrar estas livrarias na capital mineira, com pouco
dinheiro se comprava vários livros e sem dinheiro algum e com tempo, conseguia
ler alguns ali mesmo, muitas vezes em pé, outras vezes sentado em alguma
cadeira nos apertados corredores, ao lado de estantes empoeiradas, de pessoas desconhecidas
que assim como eu desejavam explorar aquele universo de conhecimento. Encantava-me
com Machado de Assis: “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu
cadáver dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas”, Érico
Veríssimo, Mário Quintana, José de Alencar, Graciliano Ramos, Drummond, Daniel Defoe com o incrível Robinson Crusoé, Jerome David Salinger e
seu eterno personagem Holden Caulfield em O
apanhador no campo de centeio.
E foi
lendo um livro de Rubem Alves (O amor que ascende a lua), que me deparei com um
texto chamado Escutatória, alguns não sabem, mas Rubem Alves foi Pastor Presbiteriano,
chegou a dar aulas no seminário presbiteriano Gammom na cidade de Lavras em Minas Gerais. Bacharel
e Mestre em teologia, defendia uma teologia liberal, o que lhe trouxe alguns
problemas frente ao presbiterianismo. Tendo que abandonar o pastorado chegou a
ser proibido de falar em púlpitos presbiterianos, mas minha intenção não é
questionar as convicções religiosas deste escritor, mas apresentar a vocês este
texto que sinceramente é de um conteúdo inestimável, e trás a tona justamente
este questionamento: querer falar e não saber ouvir. Tiago, irmão de Jesus, em
sua epístola escreve no capítulo 1:19 o seguinte: “Sabeis estas cousas, meus amados irmãos.
Todo homem, pois, seja pronto para ouvir, tardio pra falar, tardio para se irar”.
Saber escutar é fácil, é um exercício natural do nosso sentido de
audição, o difícil é saber ouvir, ouvir é muito mais que estar de corpo
presente na conversa, saber ouvir é apreciar o que o outro fala, entende-lo, compreende-lo
com alma. Quem sabe ouvir está sempre disposto a aprender, quem sabe ouvir não
se julga sábio aos seus próprios olhos, ouvir é uma demonstração de humildade.
Em Lucas 10:38-42 Maria sentava aos pés de Jesus pra ouvir-lhe os ensinamentos,
desta forma ela aprendia, calada, somente ouvindo. Encerro este texto com a
frase do gramático e compendiador latino do Séc II d.c Aulo Gélio "De
todas as coisas as mais difíceis são calar e ouvir”.
Deus me ensine a ouvir e a frear a minha
língua.
Texto de Mateus Bragança Cardoso.
2 comentários:
Parabéns Mateus! Excelente texto!
Eu realmente preciso treinar os meus ouvidos para ouvir, não apenas escutar. Obrigada por deixar ser usado pelo Senhor Jesus. Grande abraço! Paz!
Obrigado Thaís. Todos nós precisamos aprender a ouvir e reconhecer essa falha já é um grande passo.
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